Prescrição de Novos Produtos na Medicina Veterinária: O Que Podemos Aprender com o Bedinvetmab?
ATENÇÃO - As opiniões expressas e os tópicos discutidos em qualquer coluna ou artigo têm como objetivo informar, educar ou entreter e não representam uma posição oficial de nenhum orgão ou instituição.
Em março de 2023 foi lançado o Librela - bedinvetmab no Brasil. O produto, um anticorpo monoclonal, que tem como alvo o fator de crescimento nervoso (NGF) e é usado para controlar a dor em cães com osteoartrite (OA). O NGF foi reconhecido como um importante mediador da dor, crônica e os níveis são aumentados nas articulações de cães com OA. O objetivo do uso de Librela é reduzir o NGF excessivo e, assim, reduzir a dor.
E quando ele é indicado?
De acordo com as diretrizes recentes de tratamento da dor, o bedinvetmab pode ser considerado uma opção de primeira linha para o tratamento da dor da OA em cães. No entanto, antes de usar Librela, os veterinários devem (1) estabelecer que a dor que está sendo tratada é devido à osteoartrite e não a uma condição que deve ser tratada de outra forma (ruptura de ligamento) e (2) determinar que Librela é o tratamento apropriado para o cão individualmente. Existem muitos cães para os quais Librela pode ser uma ótima opção e SIM vemos isso na prática e, desde seu lançamento, houve muitos cães para os quais Librela proporcionou controle excepcional da dor e melhora em sua qualidade de vida. Mas, Librela (nem AINEs) devem ser prescritos sem primeiro estabelecer um diagnóstico. É importante que um exame físico, ortopédico e neurológico completo seja realizado e um diagnóstico de dor induzida por OA seja estabelecido antes de iniciar Librela.
Os estudos com Librela garantem boa resposta em média de até 50% dos cães que utilizaram o produto. A maioria dos estudos são com cães saudáveis, com OA, sem comorbidades associadas. E atualmente na bula brasileira, sua contraindicação é para filhotes - não aplicar em cães com até 12 meses, e em gestantes, e pacientes que tiveram sinais de hiperssenbilidade ao produto. No Canadá a bula teve mudanças recentes.
Porém, com advento e popularização do produto entre nós veterinários, iniciaram muitos relatos de colegas e tutores sobre possiveis efeitos graves ao uso de Librela incluindo pacientes caninos brasileiros. Para quem tiver interesse, existem grupos muito corretos no Facebook sobre tutores e suas experiências com Librela.
O Bedinvetmab foi aprovado pelo FDA no final de maio de 2023 e aprovado para uso na Europa em 2020. Em 16 de dezembro de 2024, o FDA publicou uma carta aos veterinários detalhando os resultados da análise do Centro de Medicina Veterinária sobre os relatos de eventos adversos para cães tratados com Librela (bedinvetmab).
Este é um marco para a medicina veterinária, mas também um alerta para reflexões importantes de como podemos utilizar de forma segura para nossos pacientes, legalmente e judicialmente novos medicamentos que chegarão ao mercado veterinário.
A Revisão Padrão de Eventos Adversos da FDA resume os eventos adversos relatados entre a data de aprovação do Librela em maio de 2023 até março de 2024. Embora a maioria dos relatórios tenha sido enviada por veterinários ou outros profissionais de saúde, os relatórios também podem ser enviados por donos de animais . Os sinais relatados são então avaliados como provavelmente relacionados ao medicamento, possivelmente relacionados ao medicamento, improváveis de serem relacionados ao medicamento ou informações insuficientes para fazer uma avaliação .
De acordo com o comunicado, “ os eventos adversos identificados e analisados incluem: ataxia, convulsões, outros sinais neurológicos, incluindo, mas não se limitando a, paresia, decúbito, incontinência urinária; poliúria e polidipsia. Em alguns casos, a morte (incluindo eutanásia) foi relatada como resultado desses eventos adversos .” Na Revisão Padrão de Eventos Adversos, os sinais clínicos mais frequentemente relatados foram ataxia, anorexia e letargia .
As autoridades também recomendaram adicionar uma seção de Experiência Pós -Aprovação (PAE) ao rótulo atual do Librela que avisa sobre esses potenciais efeitos adversos .
Nós, médicos veterinários, somos responsaveis pelas prescrições realizadas para nosso pacientes e suas familias. Mas afinal, como aprendemos como situações como essa?
1️⃣ Atenção à Avaliação Clínica
Produtos inovadores exigem que o veterinário avalie cuidadosamente se são adequados para cada paciente. Além de conversar com os promotores do produto, é nossa obrigação entender os mecanismos de ação do produto, indicações, e alertar os tutores a efeitos colaterais, expectativas.
No caso do Librela, é crucial garantir que a dor esteja realmente associada à osteoartrite.Garanta uma avaliação minuciosa, incluindo exames recentes.
Deixo uma série de links ao final deste post, sobre mecanismo de ação, e eficácia do produto. Lembre-se nenhum produto será perfeito, sem efeitos colaterais, e é claro, e infelizmente, não funciona para todos pacientes.
2️⃣ Monitoramento e Comunicação
A prescrição é só o começo. Monitorar possíveis efeitos adversos e reportá-los (à Zoetis ou FDA, neste caso) ajuda a fortalecer a segurança de produtos no mercado.
No Brasil, a indicação é reportar os efeitos adversos ao SAC da ZOETIS. E ao serviço de vigilância da ANVISA - VIGMED sistema disponibilizado pela Anvisa para que cidadãos, profissionais de saúde, detentores de registro de medicamentos e patrocinadores de estudos possam reportar suspeitas de eventos adversos relacionados a medicamentos e vacinas. No site da ANVISA não tem nada estruturado somente para medicamentos veterinários.
Mas é fato, mais do que falar, precisamos comunicar, e exigir dos orgãos mudanças em relação a transparência e noticiar os efeitos adversos. Entendo que isso parte de medidas de politicas públicas e vão além do mercado veterinário, mas a mudança pode vir da pressão da nossa classe, em relação a orgãos que pdoem se comunicar melhor com a Anvisa por exemplo CFMV, CRMV.
Outro ponto importante da comunicação é transparência tanto das empresas, e falta de publicações brasileiras sobre o impacto do medicamento no mercado brasileiro, resposta clinica, efeitos adversos.
3️⃣ Inovação x Responsabilidade
Produtos inovadores são promissores, mas reforçam a necessidade de educação contínua, análise crítica e discussões entre colegas sobre os riscos e benefícios.
4️⃣ Importância da Pesquisa Pós-Mercado
A fase de pós-aprovação é tão importante quanto os estudos iniciais. Ela permite ajustes e maior segurança para os pacientes. E deve ser cobrado por nós que indicamos os produtos! Aos orgãos e as empresas que vendem o produto, mais uma preocupação que pode aumentar se pressionarmos perguntando para termos respostas.
5️⃣ Precisamos estudar mais!
O avanço da medicina veterinária nos dá ferramentas incríveis para melhorar a vida dos nossos pacientes, mas cada novidade vem acompanhada da responsabilidade de utilizá-la com consciência, sempre colocando o bem-estar animal em primeiro lugar. Mas essa responsabildiade e segurança de quando indicar , individualizar cada paciente vem com segurança dos estudos, leia os artigos sobre os produtos, mantenha-se atualizado.
É sempre uma boa ideia fazer exames de sangue antes de começar um novo medicamento. Se você identificar uma nova condição médica, é recomendado estabilizar o paciente antes de começar a tomar Librela e os exames de sangue devem ser monitorados como você faria rotineiramente para a doença específica. O monitoramento de exames de sangue não é recomendado atualmente como monitoramento de rotina para o uso de Librela.
Os cães devem ser reexaminados por um veterinário após iniciar o Librela para garantir que o produto seja eficaz e que efeitos colaterais não sejam observados. Se os cães estiverem retornando para consultas técnicas para suas injeções, é uma boa ideia veterinário tenha uma lista de verificação de perguntas como esta para fazer antes de administrar o Librela para identificar potenciais sinais de alerta.
Como eu tenho feito?
LEMBRANDO QUE AQUI, NÃO TEM CERTO E ERRADO - OPINIÃO DE UMA ÚNICA PESSOA (e quem sou eu na fila do pão)
Atualmente, inicio a conversa sobre Librela, quando todos tratamentos já foram utilizados, e o paciente não apresentou resposta. Converso sobre prós e contras, todas discussões acima, incluindo o que o FDA, bula canadense. Indico tutores que estão utilizando para conversar com os tutores que podem pensar em fazer o medicamento. Realizo todo exame clinico, e laboratorial. E faço acompanhento quinzenal no primeiro mês da aplicação do medicamento. A parte mais importante aqui seria deixar claro para o tutor de todas essas discussões, links se quiser acessar sobre o produto, e decidir sobre, inciiando com a dose menor se for o caso de aplicação.
E que fique claro, que este post não tem nada a ver com a Zoetis, ou qualquer empresa. Atualmente um cão meu de 16 anos utiliza Librela e segue muito bem! Mas é um caso pontual, e assim como efeitos adversos, temos vários relatos de boas respostas, o que estamos cobrando aqui é transparência de todo mercado e como poderiamos organizar melhor as informaçoes sobre efeitos adversos de novos produtos no mercado que competem com a segurança dos nossos pacientes.
🗨️ E você, o que pensa sobre o uso de novos produtos na prática clínica? Como gerenciar o equilíbrio entre inovação e segurança? Compartilhe sua opinião nos comentários!
Bora estudar?
Seguem os links importantes, se você utiliza ou tem dúvidas sobre Librela ( só clicar nos links - texto laranja - do texto acima e abaixo:
Relatório FDA 2023-março 2024 - efeitos adversos
Pronunciamento da Zoetis sobre a carta recente do FDA
Respostas interessantes sobre o artigo acima - https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S109002332400114X?ref=pdf_download&fr=RR-2&rr=89856ccbfb5eb087
Artigo Anticorpos monoclonais anti-fator de crescimento nervoso para o controle da dor em cães e gatos
Excelente!! Obrigado pelo texto!